quarta-feira, 14 de julho de 2010

Boo!

Corri jardim adentro sabendo q ele estava lá me esperando, as garrafas de cerveja se chocavam durante a corrida, o tilintar delas faziam com que eu lembrasse o seu gosto gelado, garganta abaixo.
Abri a porta dos fundos, guardei a cerveja na geladeira e o chamei:
- Richard!
- Oi – respondeu.
- Eu trouxe a cerveja.
Ouvi sua risada e seus passos no segundo andar.
- Quantas?
- Doze!
- Quem mais vem?
- Ninguém, só nós dois.
- Pra que tanto?
- Pra gente morrer.
Nós rimos e lá em cima ele derrubou algo.
Estávamos em uma casa antiga, com janelas francesas e cortinas escuras. Às vezes eu não sabia como íamos parar em lugares como aquele, sempre tão antigos, tão arquitetonicamente ricos e eu me deliciava com toda história escondida em seus pilares.
Andei até a biblioteca, respirei fundo. O cheiro dos livros antigos encheu meus pulmões. Sentia a textura das páginas amarelas e rolava a naftalina entre os dedos quando inalava aquele ar. Ar familiar.
- O quê você está fazendo? – Richard gritou.
- Já subo.
Respondi com os olhos ainda fechados para não perder aquela sensação nostálgica. Nostalgia do que não foi, do que eu não vivi, nem senti, mas era meu quando eu respirava.
Fechei as portas da biblioteca e andei pelo corredor apertado e milhões de sussurros vazavam das paredes, como se elas quisessem me contar o que aconteceu, como se eu quisesse saber. E eu queria, parei e tentei ouvir. O som cessou. Tentei ouvir mais vezes, mas elas desistiram de contar.
Passei pela sala ampla, desliguei a TV e andei até a escada. As vozes sussurravam quando eu não pretendia ouvi-las.
Antes de subir olhei em volta, a luz que entrava pelas janelas era incrível, aquele avermelhado do fim da tarde fazia tudo ganhar movimento e Richard dava o som. Não sei que diabos ele estava fazendo, mas de minuto em minuto derrubava algo no chão de madeira grossa.
- Vem rápido – ele gritou.
E eu corri, parecia urgente, devia ser besteira, mas eu sempre acreditava quando a voz dele soava desesperada.
Na metade da escada algo me segurou, eu puxei, minha perna parecia presa.
-Merda- bradei, procurando nos degraus algo que me prendesse.
Nada nos degraus. Eu puxei a perna e ela continuava presa, forcei tentando subir e senti algo prender nela com mais força. O pânico começou a subir pelo estômago e a voz ficou embargada na garganta, atrás de mim não havia nada, mas no reflexo na televisão havia.
O contorno perfeito de um corpo prendia meu calcanhar e eu esperneei feito louca, as mãos presas no corrimão, mas a voz não saia.
“Não, você não vai. Saia da minha casa” as vozes diziam isso cada vez mais alto.
-Richard, Richard - o grito saiu abafado pelo desespero.
Ouvi ele correr e em menos de dois segundos estava na escada, perto de mim.
Pegou meu braço e puxou-me para cima, enquanto aquilo me puxava para baixo e repetia incansavelmente para que saísse dali.
Segurei o braço de Richard com as duas mãos cravando fundo as unhas nele. A força sob meu calcanhar cedeu e eu praticamente voei para cima e ele me segurou com uma força surpreendente, como jamais havia segurado antes. Afundei o rosto na curva de seu pescoço me perguntando o que havia acontecido.
- O que foi isso? – perguntou em estado de alerta, girando o corpo para monitorar as coisas ao nosso redor.
- Eu não sei.
Tinha até medo de olhar em volta, não sabia o que veria, não queria abrir os olhos, mas me afastei e olhei. Nada diferente. Janelas francesas, cortinas escuras, luz avermelhada.
Ouvia um zunido ainda, como se dez pessoas falassem ao mesmo tempo, tampei os ouvidos com força. Richard andava de um lado para outro, olhando atrás dos móveis quando um vaso de porcelana voou em sua direção. Surreal.
Com a mão ele protegeu o rosto e os estilhaços voaram pela sala inteira. Corri até ele, peguei sua mão ensangüentada e o arrastei até o banheiro. Coloquei-a debaixo d’água e tirei cuidadosamente os cacos que pontilhavam sua mão.
Eu estava apavorada, ele quase catatônico, não respondia quando eu perguntava e quanto maior o silêncio maior o meu pavor.
- Segura – disse enrolando uma toalha em sua mão.
- Eu não entendo – ele disse.
- Eu também não, mas eu sei o que eu vi e quero sair daqui agora.
E nós andamos o mais rápido possível para fora da casa, deixando para trás a cerveja, as janelas francesas e o pôr-do-sol .

3 comentários:

  1. Histórias de terror agora?

    Beijo, senhorita Patrícia! =P

    P.S.: Adoro ler seus contos ;)

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  2. 14 de julho teve um pooooousteee *---*


    oobrigado piiim *-*


    it makes you chill to the bones *o*

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